Coimbra, 1 de Maio de 1974.
Nunca vi um dilúvio de gente desta natureza em toda a minha vida. Nem a procissão do Senhor Santo Cristo dos Milagres, que é a maior de todas as que se realizam, também em Maio, nas Ilhas dos Açores, se pode comparar com o que hoje assisti com as lágrimas rebentando-me com gostosura dos olhos cheios. Era um tejo transbordando de povo correndo da Praça da República até ao Estádio Universitário, na margem esquerda do Mondego.
Miguel Torga seguia perto de mim. Procurei ler-lhe no rosto o que lhe ia na alma. Não consegui. Mas a sua presença na grandiosa procissão cívica deu ao acontecimento uma garantia de seriedade patriótica- a Poesia e a Revolução de mão dadas pela avenida abaixo. Oxalá seja este himeneu duradouro.
Até o meu filho mais velho, o José Manuel, que tem pouco mais de sete anos, teve hoje o seu primeiro acto de emancipação doméstica- perdeu-se por entre a multidão e só regressou a casa ao princípio da noite! E estava todo contente, porque, segundo declarou, sumiu-se de propósito, porque conhecia as ruas que o podiam conduzir de regresso a casa. Quis também saborear o seu quinhão de liberdade.
Ajuizando pela multidão que seguia no cortejo de Coimbra e em todos os outros que vi, à noite, pela televisão, deu-me a ideia de que toda a gente deste País estava ansiando pela democracia. Mas não serão democratas a mais numa nação tão pequena? É já tempo de começar a desconfiar de tanta fartura.
IN CRISTÓVÃO DE AGUIAR, RELAÇÃO DE BORDO ( 1964-1988) Pag. 124
sábado, 26 de abril de 2008
Coimbra, 1 de Maio de 1974, por Cristóvão de Aguiar, in Relação de Bordo, 1964-1988.
Publicado por Lapa às 14:51:00
Secção: AÇORES, COIMBRA, HISTÓRIA DE PORTUGAL, PICO DA PEDRA, Relação de Bordo I, Textos avulso
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TANTO MAR
A Cristóvão de Aguiar, junto
do qual este poema começou a nascer.
Atlântico até onde chega o olhar.
E o resto é lava
e flores.
Não há palavra
com tanto mar
como a palavra Açores.
Manuel Alegre
Pico 27.07.2006
do qual este poema começou a nascer.
Atlântico até onde chega o olhar.
E o resto é lava
e flores.
Não há palavra
com tanto mar
como a palavra Açores.
Manuel Alegre
Pico 27.07.2006
1 comentário:
Naquele dia, acredito que qualquer Açoriano, mesmo descrente, se lembrasse do Senhor Santo Cristo dos Milagres!
Uma excelente peça literária.
Obrigado.
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