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sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Expresso das Nove 20.º aniversário: “Desafios dos Açores para o Século XXI”, publicados em livro, com um texto de Cristóvão de Aguiar.

Veja o texto aqui

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A edição, que reúne textos de 100 personalidades açorianas e comemora o 20º aniversário do Expresso das Nove, pode ser adquirida na Livraria Solmar.

O livro que assinala os 20 anos do Expresso das Nove já se encontra à venda na Livraria Solmar, em Ponta Delgada.

A publicação inclui a totalidade dos textos das 100 personalidades que participaram na edição especial do jornal, subordinada ao tema “Desafios dos Açores para o Século XXI”, que foi para as bancas no passado dia 26 de Março.

Da lista de personalidades que aceitaram pensar a Região e as suas potencialidades à luz de um mundo global nas décadas que se avizinham, constam nomes como os de Álvaro Monjardino, João Bosco Mota Amaral, José Medeiros Ferreira, José Manuel Monteiro da Silva, Mário Fortuna, Cristóvão de Aguiar, Gustavo Moura, entre muitos outros.

Todos os escritos estão agora disponíveis em livro de capa dura, que pode ser adquirido, em Ponta Delgada, pelo preço de 20 euros.

O Expresso das Nove foi fundado a 22 de Março de 1990, então com o nome de Jornal de Ponta Delgada.

Jornal Diario

2010-10-01 18:00:05

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Muito barulho por nada (III) (IV) Much ado about nothing ou a Bíblia segundo Saramago, por Cristóvão de Aguiar in Destreza das DúvidasOctober 30, 2009 5:23 pm

Em continuação do santo Evangelho segundo José Saramago, é bom não esquecer que o tema do pecado de Caim, o primeiro assassino da humanidade, a tomar como verídicas as palavras do Génesis, não foi uma novidade trazida pelo nosso Nobel à Literatura. Já antes dele, Byron, Baudelaire, Victor Hugo e Tournier trataram do assunto com outra elevação, adiante-se já a bem da verdade. O que irrita em Saramago, neste seu último romance, é a leviandade e a pobreza de ideias e falta de argúcia interpretativa com que trata os textos bíblicos, não raro lançando mão de uma linguagem escabrosa, que pouco dignifica quem a utiliza.
Exemplifique-se: “O lógico, o natural, o simplesmente humano, seria que abraão tivesse mandado o senhor à merda, mas não foi assim…”; ou, na mesma página: “Quer dizer, além de tão filho da puta como o senhor, abraão era um refinado mentiroso…”; mais adiante, na página 106, escreve o Nobel: “Lúcifer sabia o que fazia quando se rebelou contra deus, há quem diga que o fez por inveja e não é certo, o que ele conhecia era a maligna natureza do sujeito”… Linguinha de prata, como se diz na Ilha! Saramago já veio pedir desculpa por ter chamado filho da puta ao senhor. Mas, como bom teólogo que está provando ser, logo acrescentou: “Ele não é filho da puta, porque não tem pai nem mãe!”
Nada disto me choca no sentido religioso, mas convenhamos que o vazio de ideias e a escrita paupérrima, esses sim, escandalizam quem quer que seja, crente, ateu ou agnóstico, sobretudo quem ama a boa escrita e detesta mentes distorcidas!
(continua)
(IV)
Saramago analisa o texto bíblico ao pé da letra. Atente-se nesta invectiva do Nobel a um teólogo, numa entrevista televisiva:

“Que autoridade têm os senhores para pôr na Bíblia o que lá não está escrito?” Que me desculpe o escritor, mas parece que a sua interpretação bíblica pede meças à das Testemunhas de Jeová e à dos Adventistas do Sétimo Dia, que esperam Cristo desde 22 de Outubro de 1844, pelas contas feitas, e bem feitas, pelo seu fundador, William Miller, antes pertencente à igreja Baptista e depois fundador do Adventismo por ter interpretado a Bíblia de modo diferente do dos baptistas. Nas suas contas baseou-se nas profecias de Daniel. Está escrito! E o que está escrito é a palavra de Deus… e a ela não se pode mudar um til! Deu no que deu: em 22 de Outubro de 1844, toda a gente, de olho no céu, à espera e Jesus não desceu… Grande foi a desilusão: ficou para a história como o Dia do Grande Desapontamento. Houve debandada quase geral dos fiéis. Sentiram-se defraudados: foram enfileirar-se noutros credos, fundando outros… Mas, e há sempre uma interpretação à letra que nos pode sair ao caminho: Os poucos que restaram fiéis à igreja, agora dirigida por Helen White, a profetisa dos adventistas, escreveu: Cristo realmente principiou a viagem, mas ficou a meio, em quarentena, num lugar entre o céu e a terra, esperando por melhor ocasião para aterrar no nosso planeta…
Não abona muito em favor de um romancista da envergadura de Saramago ser tão estrito na interpretação de um livro polissémico. E tanto assim é que há centenas e centenas de igrejas cristãs, todas elas baseadas no mesmo livro, a Bíblia, cujos textos, pelo visto, podem ser interpretados de milhentas maneiras, ao gosto da imaginação de cada qual. Cada uma religião cristã de per si (e todos os dias nasce uma nova agremiação) são, segundo os seus pastores e teólogos, as únicas verdadeiras, as que melhor interpretam a palavra inspirada de Deus… Vamos agora fazer um exercício com dois romances de José Saramago: Jangada de Pedra e No Ano da Morte de Ricardo Reis. Se os interpretarmos como Saramago o faz em relação à Bíblia, temos que, na Jangada de Pedra, a Península Ibérica se desarreiga do resto da Europa e vai pelos mares afora em forma de jangada… Assim está escrito, assim se deve interpretar, caso contrário ainda podemos ter Saramago de dedo em riste a ameaçar: “Com que autoridade pões nos meus livros o que lá não está?” O mesmo em relação ao outro romance, em que o seu autor traz Ricardo Reis (heterónimo de Pessoa) do Brasil, onde se encontrava homiziado, para Lisboa, via marítima, ressuscita-o, fá-lo viver na capital durante algum tempo, morrendo-o mais tarde e enterrando-o no cemitério do Alto de São João. Quem poderá acreditar nisso, se tomado à letra? Duas ricas metáforas serão, que como tal devem ser interpretadas, mas Saramago não consente… A avaliar pela sua exegese bíblica, tem a razão do seu lado, como sempre… Até quando discursou, em Lisboa, nas comemorações do 25.º aniversário da Revolução de Abril: Se não tivesse havido revolução, o país estava como está!
Só de um Nobel, na altura ainda a cheirar a novo, poderia sair tal pesporrência. Pôs aquele ovo na sessão comemorativa e logo abandonou a sala, para ir dizer missa em outra freguesia, que a ocasião era de discursatas… Ninguém objectou. Temor reverencial!
(continua)

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Muito barulho por nada (II) Much ado about nothing ou a Bíblia segundo Saramago, por Cristóvão de Aguiar. (cont. II)

Sabendo-se pouco, isto é, sem a profundidade necessária, sobre o que se quer destruir, distorcer ou criticar, pode entrar-se num jaco­binismo sem consequência, apenas para chocar o burguês, ou num anticleri­calismo primário, como aconteceu durante o século XIX. Nesse tempo, o Deus do Velho Testamento era já considerado cruel, sangrento, bruto, tudo quanto dele diz agora, em segunda mão, o nosso Nobel da Literatura. Nada de novo, portanto! Dou como exemplo o poeta Guerra Junqueiro e o seu livro A Velhice do Padre Eterno. Quem o lê hoje? Quem se incomoda com as suas dia­tribes? Ouçamos Guerra Junqueiro:

As crianças têm medo à noite, às horas mortas,
Do papão que as espera, hediondo, atrás das portas […].
Não te rias da infân­cia, ó velha humani­dade,
Que tu também tens medo do bárbaro papão,
Que ruge pela boca enorme de um trovão,
Que aben­çoa os punhais san­grentos dos tiranos,
Um papão que não faz a barba há seis mil anos,
E que mora, segundo os bon­zos têm escrito,
Lá em cima, detrás da porta do infinito!

Tudo isto é fogo-de-artifício, bem escrito, mas que nada adianta, porque não desce aos infernos da dúvida… É tempo de citar o Eclesiastes:

Não há nada de novo neste mundo. Aparece qualquer coisa e alguém diz: ‘Olha, isto é novo!’ Mas tudo aquilo já existiu noutros tempos, muito antes de nós. Já ninguém se lembra das coisas passadas e o mesmo acontecerá com as do futuro; não se recordarão delas os que vierem mais tarde” […].

É muito difícil ser original. E Sara­mago não o é. Pelo menos neste seu último romance, Caim, que se situa no Velho Testamento, nem muito menos no Evangelho Segundo Jesus Cristo, que tem como campo de confronto o Novo Testamento.

Escrevi acima que este livro não merecia o alarido que dele está sendo feito. Por duas razões: Primeira, porque o barulho não se deve à leitura do livro; segunda, porque não se trata de uma obra maior do escritor. Foram sopradas as trombetas de Jericó, não cuido nem interessa se intencionalmente, e derrubaram-se os muros da nossa cidade ou paróquia provinciana, que mostrou à saciedade que milhares dos seus habitantes ainda não saíram da idade da pedra no tocante à literatura, mas correram às livra­rias para se abastecerem do romance e grande parte deles tam­bém da Bíblia. Afinal, Sara­mago está a ser colaborante ou então o aviso grave que fez sobre a perigosidade da Bíblia deu efeito contrário. Não conseguiu apear o mito!

José Saramago, quanto a mim, atingiu o apogeu em No Ano da Morte de Ricardo Reis, embora os dois primeiros romances, Levantado do Chão e Memorial do Convento, sejam duas obras de grande valor. É humano e natural que um escritor tenha cur­vas ascendentes e descendentes. Quando se alcança o cume, o que se segue é a descida. O que é preciso é saber sair a tempo, sem dramas, a fim de se não estragar o bom que para trás ficou. Saramago, com Caim, continua em linha descendente. Há por lá muitos lugares-comuns e expressões infelizes, impróprios de um escritor da sua envergadura. Escrever um livro em quatro/ cinco meses, como con­fessou numa entrevista televisiva, se bem que o assunto lhe esti­vesse a latejar há muitos anos, não será bem avisado. Aquando da publicação de A Viagem do Ele­fante, título que pode ser interpre­tado tanto no sentido literal como no figurativo, sendo que este, no meu entender (a inter­pretação é livre), pode ser interpretado como o percurso de um grande escritor (o elefante) que, com esse livro, iria terminar o carreira literária. Com certeza que alguns dos críti­cos maldi­zentes da sua obra anterior o intuíram, porque logo se apressa­ram ao beija-mão ou ao panegírico fúnebre: “Trata-se de um hino à Língua Portuguesa”, cantaram em coro… A nossa língua deve ser um volumoso hinário de que já nin­guém se lembra nem das músicas nem das letras. Excitações… Do romance Caim foi escrito: litera­tura pura… Quem há-de gabar o noivo senão…?

(continua)

Furtado do destreza das dúvidas

Muito barulho por nada. Much ado about nothing ou a Bíblia segundo Saramago, por Cristóvão de Aguiar. (cont. I)



sábado, 24 de maio de 2008

25 Olhares de Abril, Coordenação de Carlos Garrido, Prefácio de Maria Barroso, Campo das Letras, 2008. Inclui Crónica do Escritor Cristóvão de Aguiar.

A obra com o prefácio de Maria Barroso e capa de Albino Moura, é assinada por:


Abrantes Raposo, Aida Baptista, Albino Moura, Alice Tomé, Ana Júlia Sança, Artur Vaz, Carlos Cardoso Luís, Carlos Garrido, Carlos Pimenta, Cid Simões, Cristovão de Aguiar, Domingos Marques, Fernando Barão, Fernando Vasco, Gabriela Silva, Ilda Januário, Joaquim Alves Lavado, Jorge Paulos, José Carlos Fonseca, José Nascimento, Kalidás Barreto, Luís Alves Milheiro, Manuel Freire, Manuela Marujo e Maria Luísa Baptista.













25 Olhares de Abril, como o próprio título sugere, é um conjunto de textos de diferentes autores que, dentro e fora de Portugal, relatam a forma como viveram as emoções de uma revolução anunciada. Alguns, pela sua militância e proximidade, sentiram-se actores da mudança; outros, mais distantes, aguardavam expectantes que tudo se definisse.
Porém, e independentemente da visão que cada um tem, todos os autores deste livro se sentem unidos por um sentimento comum – o de que deixam o seu testemunho genuíno e autêntico sobre um acontecimento que mudou a vida de todos os portugueses. Por isso, esta pluralidade de olhares, mais do que uma obra literária, é um documento destinado às futuras gerações, evitando, assim, que se apague a memória dos que viveram e fizeram História.

Carlos Garrido nasceu em Lisboa, em 1944. Viveu na Freguesia do Sacramento até 1972 e, desde então, mora em Almada. É licenciado e doutorado em Economia. Publicou diversos artigos científicos e técnicos em revistas nacionais e estrangeiras, no domínio da análise da conjuntura económica e da economia das catástrofes. Tem publicado crónicas na imprensa regional e nacional. É membro de diversas instituições científicas, culturais e de solidariedade social. Tem prestado colaboração em diversas universidades portuguesas e estrangeiras. Foi assessor no Departamento de Prospectiva e Planeamento até à sua aposentação, em 2004. Actualmente é investigador no Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto e professor de Economia no IADE. Tem publicadas as seguintes obras literárias: "A Lua Vem com a Gente?" (Editorial Escritor, 2003) e "O Pintor de Palavras" (Editorial Escritor, 2005).

Lançamento/ Santarém
Hoje, 24 de Maio 17h30
Sala Multiusos - Centro Cultural Gil Vicente
25 OLHARES DE ABRIL
136 PP. ISBN 978-989-625-288-5 PVP 10.50 €

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Dicionário de Falares dos Açores, de Soares de Barcelos, com Prefácio de Cristóvão de Aguiar, Almedina 2008.

PREFÁCIO
Não sendo um linguista de formação académica, aceitei de bom grado o desafio de prefaciar este trabalho que agora se apresenta ao leitor menos como um livro no sentido tradicional do que como um glossário de termos portugueses antigos, em parte ainda utilizados pelos falantes das Ilhas do Arquipélago dos Açores. A um escritor empenhado, como sempre procurei ser, nada é defeso. Principalmente, e neste caso em particular, se é da linguagem das Ilhas que se trata. Os livros de ficção que tenho vindo a publicar ao longo das últimas três décadas são testemunho do meu empenhamento em dar à linguagem popular micaelense o estatuto literário que ela merece pela sua expressividade e riqueza semântica.
Propositadamente, não escrevi linguagem açoriana, visto que açoriano é um adjectivo que pouco ou nada qualifica em relação à realidade cultural do Arquipélago - nove Ilhas diversificadas entre si pelo modo de estar e de conceber o mundo e a vida. Deixo-o, por isso, atido apenas à sua significação estritamente gramatical. As próprias aves que deram o nome ao Arquipélago nem sequer são oriundas destas paragens, pelo que, à partida, houve confusão entre milhafres e açores. Dir-se-ia que os Açores receberam no baptistério águas equivocadas!
[...]
Cristóvão de Aguiar
Ilha do Pico, Maio de 2007

Dicionário de Falares dos Açores - Vocabulário Regional de Todas as Ilhas
J. M. Soares de Barcelos

Editora: Almedina
Tema: Dicionários e Gramáticas
Ano: 2008
Tipo de capa: Brochada
ISBN 9789724033761
614 págs.
Peso: 1.160 Kg

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Cristóvão de Aguiar, 40 anos Dom Quixote.

QUARENTA, Vários autores, Ed. Dom Quixote, 286 págs., €24,00. A Dom Quixote, ao celebrar 40 anos de existência, reuniu um conjunto notável de contos dos seus autores nesta obra, onde se pode encontrar parte do que melhor se escreve em Língua Portuguesa. Inês Pedrosa, Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa, Lídia Jorge, José Eduardo Agualusa, Manuel Alegre, Cristóvão de Aguiar e muitos outros convidam à leitura destes excelentes textos.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

CÂNTICO DE AMOR, POR CRISTÓVÃO DE AGUIAR

Ainda sou capaz de um cântico de amor. Não sejas tão vaidoso… Sinto que os sessenta e sete anos esbarrondados por sobre este corpo nada pesam no reino poético. Tal como a infância, o espírito não envelhece nem nunca se cansa. Nem tão-pouco a alma. Não em verso. A poesia modelada nessa linha arquitectónica sempre te foi muito madrasta. O livrinho com que te estreaste dá conta dessa indigência poética! Em prosa, dizem que sim, que vou encontrando, por entre o cascalho das palavras, uma flor ou pepita de ouro, iluminando a semântica da frase escurentada de seus complementos e outros enfadonhos acessórios gramaticais. Só no fundo da cratera poderei ir buscar as ferramentas para entretecer as asas desse canto e acordá-las para o magma e para o voo. Ou inventá-las para outro êxtase ainda mais pando. Lá fora, não. Faz frio e há nuvens escuras de onde cai uma chuviscada tristeza. Posso pedir-te um pouco de sonho emprestado. Sei que mo concedes, sobretudo aquele pedaço que tem partido comigo para igual aventura.
Para dois sonhos companheiros de viagem, o paraíso ou o inferno ficam sempre mais perto, com a vantagem de ao primeiro nunca se aproar, regra segura da saúde do sonho – anima-o uma febre alta, tornando-o num ente traquinas dentro da gente. Ao inferno tens chegado vezes sem conta!

(Cristóvão de Aguiar)

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

INAUGURAÇÃO DE UMA EXPOSIÇÃO DE PINTURA, POR CRISTÓVÃO DE AGUIAR.

Seriam pouco mais de uma dúzia e meia de quadros a óleo, exce­lente­mente emoldurados, de oitenta contos para cima, sendo cento e quarenta o preço máximo, dois ou três dos quais foram vendi­dos a catedrá­ticos, que têm da arte pouco mais, ou nem tanto, do que a noção do bem feito, do bonitinho, do deco­ra­tivo. Pelo menos àqueles que lá estavam ser­vindo de holofotes à sala não ouvi, e estava bem atento e de orelhas afita­das, nenhum daqueles comentários perti­nentes e defini­tivos acerca daquela pintura nem de pin­tura em geral – ati­nham-se mais ou menos às exclama­ções nem mais profundas, nem mais superfi­ciais das que minha Avó even­tualmente proferiria diante de um quadro de uma abó­bora-menina pintada a preceito que talvez pela naturalidade com que estava repre­sentada lhe apete­cesse abrir, tirar as pevides e assá-las a seguir ─ era e sou per­dido por elas, e minha Avó sabia-o, por isso nunca se esquecia de as assar, no forno, à sexta-feira, temperadas com sal e calda de pimenta – até se me estão cres­cendo águas na boca. Seria este o seu maior e mais sábio elogio, porque consti­tui­ria a prova incontestável de que, diante dela, essa pintura mais não era do que uma abóbora de verdade, fugida do aboboral, sabe-se lá por que motivos, às tantas larapiada, e se fora refu­giar na tela para semente...

(Cristóvão de Aguiar)

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

UMA VISITA AO MAR, POR CRISTÓVÃO DE AGUIAR. The English version of this text is to be found below.

Fui ver o mar. Acabo de regressar com ele aprisionado no peito. Respirei-o bem fundo e com a competente convicção para o cativar em mim. Trouxe-o também impresso na retina – olhei-me ao espelho, para confirmar ─ vi-o rebentar em inchas de uma alvura de fraldas de noiva... Estava mesmo sozinho, furioso e de sobrecenho soturno. Gosto de o surpreender assim! O porta-contentores a sair do cais não me deixa mentir. À medida que se fazia ao alto mar, a proa a fincar-se naquele chão remexido, abraçavam-se as ondas por cima, numa balbúrdia de espuma. Nessa altura já eu estava no alto da Serra da Boa Viagem, um amplo e fundo horizonte defronte dos olhos. Tinha saudades da sua voz absoluta e do seu insofrimento.
Logo após o almoço, peguei dos meus dois velhos amigos, com quem ultimamente tenho passeado por aí, e partimos em direcção à Figueira da Foz. Seguimos pelo caminho velho, mais pachorrento e humanizado.
Desde que a via rápida tomou posse do cargo, foi-se pouco a pouco transformando numa estrada do lá vai um.
À moda antiga e com aqueles encantos que as auto-estradas não têm mais. Já lá não ia há muito tempo.
(Cristóvão de Aguiar)

terça-feira, 23 de outubro de 2007

A VISIT TO THE SEA, BY CRISTÓVÃO DE AGUIAR.

A visit to the sea

I have gone to pay a visit to the sea. I have just gotten back with it captured in my bosom. I deeply breathed it with the adequate conviction in order to captivate it inside myself. I also brought it impressed in my eyes ─ I have looked at myself in the mirror to make sure it did ─ I have seen it bursting in waves of a whiteness of angel’s trumpets… It was actually alone, infuriated and with a surly countenance. I enjoy overtaking it like this. The container sliding off the wharf does not let me lie. As the ship was making for the open sea ─ the prow piercing into that restless ground ─ the billows frisked over in a foam flurry. At that time I was already on top of Boa Viagem (Good Voyage) ridge of mountains with a large deep horizon in front of my eyes. I was longing for its absolute and restlessness voice.
Just after lunch, I had taken my two old chaps with whom I have ridden here and there and started for Figueira da Foz (a city by the sea). We took the old road, more easygoing and humanised.
Since the fast lane has taken up post, the old one turned little by little into a carless road, according to the old fashioned way, but with those wonders that the fast lanes no longer possess.
I have not gone there for a long time…
(Cristóvão de Aguiar)

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Bristol Rhode Island. O Senhor Mestre Artur, Pai de Cristóvão de Aguiar, num cemitério de Bristol R. I.


UM "ATÉ LOGO" COALHADO DE ETERNIDADE

Bristol Rhode Island, 26 de Janeiro de 1992.
De novo aqui me encontro, meu Pai, cada vez mais acolhido ao calor que a tua forja foi em mim demorando e estanciando. Nenhum frio de neve semelhante a este, que sopra de um quadrante de outro mundo, ou mesmo mais intenso, estaria apto a fazê-lo esmorecer e amuar em morno e tranquilo rescaldo. Disseste até logo e presto voltaste atrás, como quem se esquece da boina, e acrescentaste: “Se Deus quiser, Conceição”... Estarias porventura pressagiando fumo de tragédia ou cheiro dela erguendo-se do ventre da manhã de horas minúsculas, irrevogáveis, integralmente nuas e tuas, abastecidas daquela solidão que precede a planura da ausência? E Ele, meu Pai, não quis. Tu, que havia pouco, a Ele te encomendaras em íntimo e recolhido diálogo contigo, como o fazias todas as manhãs para aquecê-las e oleá-las de princípio! Não quis. Bem gostava eu agora de deslindar tão misteriosos desígnios. Aqui, a teus pés, no teu leito de terra, suavemente reclinado para o Sol-poente, coberto de um lençol de relva, ainda crestada destes frios desalmados da Nova Inglaterra. Não consigo. Sempre pediste a tua morte assim subitânea, um aniquilamento à tua altura... E ela foi-te concedida. E assim abalaste da vida que te magoou desde a madrugada dos anos até ao crepúsculo. Zarpaste sem incomodar ninguém. Sem tocares com tuas mãos sábias no fantasma sempre tão contigo de poderes um dia vir a ser despejado na lixeira humana de uma qualquer instituição eufeministicamente denominada lar de terceira idade... Não lhe tocaste. Mas constituiu a tua sombra nos últimos anos que viveste no sobressalto dessa suposição. Não consigo deslindar, Pai. São tão misteriosos os desígnios! E por que disseste até logo e ainda não regressaste desse poente para onde te sumiste, vou continuar esperando dentro em mim, aqui sentado nesta banqueta de pedra despolida que a vida me arrumou. Foste sempre um homem de palavra. Às vezes mais rija que o aço da ferramenta que temperavas. Outras, terna como criança embebida a fabricar seu próprio brinquedo. E tu construíste tanto, meu Pai. Desde a manhã dos tenros anos até ao alpardusco da existência! Homem de palavra. Não posso, nem razões me assistem para pôr em dúvida a tua derradeira frase "até logo". E vieste atrás e ajuntaste "se Deus quiser". Ainda conservo, por isso, o fio da lamparina aceso. Um pavio entrançado de muitos fios de esperança. a que nunca soube morrer. Sei de um saber que não se pode explicar, mas de fonte segura - a que jorra do coração-, sei que, onde quer que estejas, Pai, ou a vir do nascente ou enfronhado no ocaso, tenho a certeza que me vais ler, ou me estás já escutando enquanto, ajeito estas palavras numa bigorna, quem sabe se uma extensão da tua, todavia menos concreta, mas igualmente suada, que isto de querer ser serralheiro da palavra, como foste do ferro e do aço, não é ofício a que qualquer um se possa alcandorar, pelo menos com a perfeição que atingiste no teu. Empresta-me as tuas mãos, Pai, e tudo se tornará mais claro deste lado da vida em que me encontro. Faz hoje exactamente um ano. Saíste de casa. Até logo. E vieste atrás para emendar a secura da frase. Se Deus quiser. Não quis. Como o tempo corre sem freio, esse cavalo sem tino e de tiro puxando o arado que nos vai lavrando a leira dos sonhos com relhas de alguma ilusão, necessária. Diferente daquelas que forjaste para charruas verdadeiras de desventrar a terra, desvendando-lhe os segredos e a intimidade. Já não sentes o tempo, Pai! Despiste-te do casacão do tempo, que, por vezes, incomoda. Estás agora nu dentro de outras horas que não pesam e são leves como a eternidade. E aqui estou, meu Pai, ainda vestido do meu corpo e do tempo que o vai arruinando. No Verão passado, plantei-te flores exactamente por cima da tua cabeça. E elas medraram e floriram. Olho o céu e vejo garças. Não sei se as mesmas que te acompanharam há um ano à tua mansão ungida de silêncio e de paz. As garças não te esqueceram. Ias todos os dias alimentá-las ao Colt State Park. Conheciam-te já. Não são ingratas como certos filhos dos homens. Não te esqueceram. E acompanharam-te. Emitiram seus pios de pesar.
Trago-te este braçado de lágrimas para regar a lembrança que de ti guardo.
Até sempre, Pai!

Cristóvão de Aguiar

("O Serralheiro da Escrita", in Relação de Bordo II, Campo das Letras, 2000, pp. 188, 189 e 190, et in Emigração e Outros Temas Ilhéus, in fine. Óleo sobre tela, por Bárbara Borges)

Segundo o Prof. Doutor José Carlos Seabra Pereira, professor de Literatura da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, este é um dos melhores textos da Literatura Portuguesa sobre o Pai.

A eterna saudade do Seu neto José Manuel.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

AS DUAS ROSAS, POR CRISTÓVÃO DE AGUIAR.


AS DUAS ROSAS

Vou dar sepultura a duas rosas. Há muito tinham exalado o último suspiro da sua já tão débil nacarada tonalidade. Até rima com saudade. Não está nada mal. Sinto saudades de Ela por intermédio delas, tocou-as e ajeitou-as no solitário sobre a secretária. Por um incorrigível descuido seu, deixou sobre elas o olhar esquecido. Como podia ter largado um brinco ou um anel num qualquer recanto encantado... Acabo de as aconchegar na urna de papel que as transportará ao seu derradeiro canteiro. Antes de tudo, tive o cuidado de recolher e amealhar o seu olhar que por lá andava tresmalhado como um rebanho de miríades de luzinhas semeado à noite no espinhaço de São Jorge... Assim, sempre fico com outro fôlego e um fogo mais fortificado. Oxalá seja ecológica a sua mortalha, para que suas corolas apodreçam em descanso e suas essências subam aos etéreos alegretes de onde provieram. Mais tarde, voltarão com desejo de reflorir, noutras mesmas hastes, em entes que venham a ser rosas ou margaridas, violetas ou amores-perfeitos, estrelícias ou antúrios... Por exemplo, as orquídeas do nosso reencontro num Dezembro não muito idoso ou as despedidas-de-verão de cada fim de tarde de domingo, que agoniza primeiro nos meus olhos antes de se reclinar no horizonte. E todas as outras corolas, dobradas ou singelas, que Ela me foi soletrando, pétala a pétala, nos jardins que fomos semeando com adubo e afecto no interior dos dias! Mas eu, com este incurável vício de querer eternizar tudo, teimava em prolongar-lhes o viço, aliás como faço com coisas, pessoas, animais e comigo mesmo – devo ser uma mistura de tudo isto, mais o tropeço que represento quando livre e desnudado diante do espelho que me sou... Tão doce devia saber a um certo sentido por inventar o fruto de ser eterno! Mas, pelo menos dentro de mim, e enquanto a vida me não recusar o pão de seu sopro, acredito que o tenha conseguido. Por isso elas permaneceram, como muitas outras corolas que já foram e hão-de um dia vir a ser, e Ela própria, passado, presente e futuro, conjugadas na voz de um único verbo, talvez misto, regular ou irregular, coactivo ou incoactivo, não importa, feito carne e sangue, nervos, versos e sémen. Apenas herdou as vivas virtudes transitivas e algumas intransitivas daqueles outros verbos que, na mortalha da gramática, encontram o seu leito natural de uma morte serena e irremissível. E Ela, coroada de frésias, prevalecerá sobre todas elas!

(Cristóvão de Aguiar)

Cyrano de Bergerac

Cyrano de Bergerac
Eugénio Macedo - 1995

TANTO MAR

A Cristóvão de Aguiar, junto
do qual este poema começou a nascer.

Atlântico até onde chega o olhar.
E o resto é lava
e flores.
Não há palavra
com tanto mar
como a palavra Açores.

Manuel Alegre
Pico 27.07.2006