sábado, 29 de outubro de 2011

Entrevista de Luís Aguiar-Conraria: economista e professor na Universidade do Minho

PRIMEIRO PLANO

EXCLUSIVO
Luís Aguiar-Conraria: economista e professor na Universidade do Minho

“A crise só vai acabar quando formos mais pobres do que somos hoje”

Luís Aguiar-Conraria é doutorado em economia e professor auxiliar e vice-presidente da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho e esteve presente, no passado dia 15out11, numa conferência promovida pela Casa dos Açores do Norte, em parceria com o “Etc e Tal”.

Em exclusivo, este jovem economista traça um quadro pouco animador, mas realista, da economia nacional. Em momentos de austeridade, Luís Aguiar-Conraria coloca os seus “pontos nos is” em diversas e importantes questões relacionadas com a grave crise que vivemos.

Ele concorda com a redução dos bens da taxa intermédia do IVA; diz que o OE2012 é um péssimo plano; avisa que vamos viver pior; defende a descida da Taxa Social Única, e que temos uma cultura “mediocrática” que protege os medíocres.

Para o nosso entrevistado teremos, mais cedo ou mais tarde, de “saber fazer mais com menos” e que o regresso de Portugal aos mercados será uma realidade só lá para… 2015.

Mas há mais! Muito mais… a ler.

A grave crise que vivemos é, e de acordo com o que disse na nossa conferência, a terceira desde o 25 de Abril, se tivermos em conta o número de pedidos de ajuda ao FMI. Esta é a mais grave de todas? Até que ponto a nossa integração na Zona Euro complicou a economia e as finanças nacionais? Como e quando isto poderá acabar?

Esta é a mais grave de todas. Não há dúvidas em relação a isso. Quer por causa dos desequilíbrios macroeconómicos acumulados, quer pela incapacidade de seguir políticas monetária e cambial autónomas.

Só poderá acabar quando o saldo das nossas contas com o exterior for positivo e o Estado apresentar saldos primários positivos também. Infelizmente, tal só vai acontecer quando formos substancialmente mais pobres do que somos hoje.

Revelou que os portugueses poupam menos, e que a poupança é essencial para o crescimento ou para a estabilidade económica do País. Como é que num Portugal em que parte substancial das famílias não chega com dinheiro ao dia 20, os cidadãos e as cidadãs podem poupar alguns “tostões”? As taxas de juro são atraentes? O que foi feito aos Certificados de Aforro?

Não quero ter discursos moralistas, que são descabidos. Mas a questão das poupanças é também uma questão de atitude. Há países bastante mais pobres do que nós que têm uma população com maiores taxas de poupança.

O Orçamento de Estado para 2012
O Governo prepara-se para colossais cortes na despesa, designadamente em setores tão importantes como o da Saúde (800 milhões) e Educação (600 milhões). Ao mesmo tempo que cria receita através do aumento de impostos, com destaque para o IVA e logo no que concerne a bens tão importantes como a eletricidade, o gás, e os transportes. Essas medidas são essenciais? Os cortes na despesa são estruturais? Não falta aqui um plano ao incentivo ao crescimento?

Não há qualquer consenso quanto ao que é um bom plano de incentivo ao crescimento. Por exemplo, um desses planos foi a aposta nas Energias Renováveis, Já viu os lindos resultados desse plano? A eletricidade seria muito mais barata se não fosse essa política voluntarista. Outro plano de crescimento foi a construção de estádios. Belo resultado, não? E o da construção de aeroportos? Quase que temos de pagar aos turistas para aterrarem no Aeroporto de Beja. Independentemente da bondade de tais políticas, a verdade é que não há dinheiro para as financiar.

Concorda com a considerável redução de bens da Taxa Intermédia do IVA?

Concordo. Não vejo motivos para o Estado definir quais são os produtos mais caros ou mais baratos. Isso deve ser uma escolha dos mercados, ou seja das empresas e das pessoas. Assim, tirando um cabaz de bens essenciais, todos os produtos devem ter a mesma taxa. Outra questão diferente é a de saber se ela é demasiado alta ou não.

O Orçamento de Estado para 2012 é, ou não, um bom Plano, mesmo tendo em conta o Estado Social em que o País se encontra, enfatizando-se o crescente número de desempregados que poderão ultrapassar os 13,5 por cento no final do próximo ano?

É um péssimo plano. Infelizmente todas as alternativas são péssimas. Admito que se possa discutir algumas medidas em concreto, mas sempre propondo alternativas que conduzam a resultados semelhantes para o défice orçamental.

Por exemplo, podemos discutir se será possível reduzir menos os salários dos funcionários públicos, mas tal, implicará que se vá buscar receitas (ou reduzir despesas) a outro lado. Por exemplo, cortando nos subsídios de Natal do setor privado.

Incentivos e cortes

Devia ou não haver incentivos às pescas e à agricultura? É que se os há… não conheço. E não conheço desde a altura em que o atual Presidente da República, Cavaco Silva, então primeiro-ministro, deu cabo desses importantes setores produtivos, ao contrário do que aconteceu em outros países europeus…

Na minha opinião não devia haver nem incentivos às pescas nem incentivos para acabar com as pescas, que foi o que houve nos tempos de Cavaco Silva como primeiro-ministro. Talvez se justifiquem alguns subsídios para compensar os disparates passados. Mas a verdade é que não há margem orçamental para isso. Já seria bom que o Estado não atrapalhasse com impostos tão altos, quanto mais esperar por subsídios.

As medidas de austeridade que o Governo vai fazer aprovar, passam por um ataque direto à Função Pública, com a eliminação do 13.º e 14.º mês para os funcionários e pensionistas que ganhem mais de mil euros. Concorda com este corte radical? Em seu entender, esta é só uma medida a aplicar em 2012, ou vai durar mais alguns aninhos?

Na prática, penso que a longo prazo, um desses salários não será recuperado. No setor privado, na prática, também vai acontecer uma redução salarial, com a desvantagem de o desemprego aumentar pelo caminho.

Infelizmente, vamos todos viver bastante pior, antes de Portugal retomar uma trajetória de crescimento.

Estado social e TSU

Muita gente pergunta, e alguns são leitores do nosso jornal, se daqui a vinte anos não haverá prestações sociais (reformas) para os velhos, nem para os desempregados, isto quando se sabe que a receita das taxas não chegam para cobrir metade das despesas do Estado. É possível haver esses cortes e regressarmos ao período anterior ao da primavera marcelista?

A democracia não é um facto adquirido. É algo que se constrói. Tem muita razão na sua pergunta. No que respeita a contas públicas a nossa situação não é muito diferente da que Salazar encontrou. Felizmente que o nosso regime político atual parece ser mais estável e mais capaz de enfrentar dificuldades do que o da 1ª República.

Ainda relativamente às medidas de austeridade, o professor defendeu na nossa conferência, a descida da Taxa Social Única (TSU). O Governo pensou e estudou o assunto, mas parece que tudo ficou em “águas de bacalhau”… ficou na mesma. Por que era tão necessária para a nossa recuperação económica a descida da TSU? O problema fica resolvido com o horário de trabalho no setor privado ser aumentado meia hora por dia nos próximos dois anos?

Para onde vai o dinheiro desse sacrifício dos portugueses? Para a banca?

A descida da TSU, compensada por uma subida uniforme do IVA (para uma descida de quatro pontos percentuais da TSU, o IVA teria de subir cerca de dois p.p.), permitiria manter as receitas fiscais totais.

Ao mesmo tempo, seria uma forma encapotada de subsidiar as exportações e penalizar as importações. Correspondia a uma desvalorização cambial. Com essa medida, este período transitório seria menos difícil. Possivelmente, em vez de a recessão ser de 2,8 por cento seria “só” de 2 por cento. Não acredito que a meia hora de trabalho faça alguma diferença. A maioria dos portugueses já trabalha bem mais do que essa meia hora.

Afirmou também que o Bloco de Esquerda, há uns anos atrás, defendia a descida da TSU. Em sua opinião por que é que a posição desse movimento político mudou radicalmente?

O BE defendeu e propôs mesmo em Assembleia da República que a Segurança Social fosse financiada por um imposto sobre o valor acrescentado das empresas. Não percebo por que motivo agora são contra a descida da TSU compensada por um IVA social. Terá de lhes perguntar. É pena. Baixar a TSU seria uma forma de promover o emprego. A nossa fiscalidade protege o capital em vez de proteger o trabalhador. A descida da TSU seria um passo no bom sentido.

O regresso do Escudo
São cada vez mais as vozes que defendem a saída de Portugal da Zona Euro e o regresso ao escudo ou a outra moeda qualquer. Quais seriam os custos dessa “revolução”? E os benefícios a médio ou longo prazo?

É uma experiência praticamente sem precedentes. Nem sequer a consigo imaginar. Não tenho um quadro intelectual que me permita sequer equacionar os prós e os contras.

Imagino que o efeito final dependeria muito das condições em que fosse negociada a nossa saída. Por exemplo, as nossas dívidas passariam para a nossa moeda ou continuariam em Euros? Neste último caso, adivinho consequências catastróficas.

A recessão poderá ultrapassar os três pontos percentuais no próximo ano. Isso é quase o caos total! Não? Estamos, ou não, a seguir as pisadas gregas, ainda que com ligeiras diferenças e com algumas (hipócritas) palmadinhas nas costas vinda de senhores de peso a nível internacional… não só da União Europeia?

Em 2009, em vários países europeus, a recessão foi de 7, 8 e 9 por cento. Nós não tivemos uma quebra tão forte na altura, mas, somando estes anos todos, lá vai ser algo desse género. Vamos sair disto bastante mais pobres, não tenho dúvidas.

Voltando à questão dos incentivos ao crescimento, a regionalização, com produção e promoção dos produtos de cada terra (agricultura, pescas e indústria) não só em termos nacionais como também internacionais (leia-se exportação), não seria um bom incentivo para sairmos do marasmo em que nos encontramos?
Eu, pessoalmente, sou a favor da regionalização. Mas não me parece que isso contribuísse para sairmos da crise. Um processo de regionalização demora sempre alguns anos a ser concluído. E, se for feita, tem de ser muito bem feita.
Alternativas

Não há alternativa a esta política neo-liberal capitalista, assente no domínio do eixo franco-alemão? O Euro tem capacidades para sobreviver, ou – e sem querer que faça futurologia – voltaremos a “um Estado uma Moeda”? O Euro deveria desvalorizar?

Há sempre alternativas. É uma questão de escolhas das sociedades. O Euro não vai desvalorizar. O saldo externo na Zona Euro, como um todo, é equilibrado. Vamos mesmo ser nós a fazer a desvalorização interna (ou seja, ficarmos mais pobres).

Portugal, mesmo com as boas relações que tem com os países de expressão oficial portuguesa (mais teóricas do que práticas), não deveria apostar mais nas exportações para essas nações?

Tirando o Brasil e, se calhar, Angola, esses países têm pouca dimensão económica. As nossas maiores oportunidades aí não serão tanto de exportações. Será mais de investirmos nesses países.

“Mediocracia”

A política partidária, as finanças e a economia fazem parte da mesma família, ainda que às vezes não se entendam. Há bons políticos e economistas em Portugal? Quem?

O nosso sistema não premeia os bons políticos. Temos uma cultura mediocrática, que protege os medíocres. Há bons economistas, claro, há-os até muito bons. Mas ser um bom economista não implica que se consiga levar a cabo boas políticas económicas. Um ministro da economia ou das Finanças não é um economista, é um político.

Se fosse ministro da Economia que medida, ou medidas, tomaria de imediato? Começaria por cortar às bases ao poder local democrático, muita das vezes, também algo despesista?

Se me convidassem para ministro eu pensara que estavam a gozar comigo e desligaria o telefone. Se me ligassem novamente, eu desligaria novamente.

O “buraco” na Madeira surpreendeu-o? Não deveria o Governo ter já revelado os outros buracos que andam por aí escondidos?

Vamos com calma. De certeza que haverá muito mais buracos. Que sejam revelados à medida que forem sendo descobertos já seria bom.

Fazer mais com menos

Com o número de desempregados a crescer de dia para dia, assim como o de pessoas que se encontram no limiar da pobreza. Com a massa cinzenta portuguesa a abalar para o estrangeiro, porque aqui não arranja colocação. Como é que um país pode crescer se o seu Estado Social está a cair de podre? E como é que, não apostando na Educação, se pode formar jovens para dar resposta às exigências do futuro? Professor, teremos um Serviço Nacional de Saúde, como hoje o vemos, daqui a vinte anos?

Temos de fazer mais com menos. Tenho a certeza que cada um de nós, nas suas áreas de trabalho, sabe como fazer mais com menos. Eu vejo imensas coisas nas universidades que podem ser feitas de forma bastante mais eficiente.

Tem é de haver flexibilidade e autonomia para poder levar essas transformações a cargo. Olhando para as universidades, realidade que conheço melhor, faz sentido que um professor universitário que não faz investigação e que não ocupa cargos de gestão tenha uma carga horária semanal que vai seis a nove horas semanais? Não poderia/deveria dar o dobro das aulas? Um professor universitário que não faça investigação é, simplesmente, um professor do secundário luxuosamente bem pago. Tenho a certeza de que exemplos simples como estes abundam em todas as áreas.

Quando é que Portugal regressará aos mercados, em 2013 ou em 2020?

2015 é a minha aposta, mas este ministro das finanças parece determinado em que seja mesmo 2014. Vamos ver.

Por último, como é que os seus alunos reagem à situação económica em que se encontra este país à beira mar plantado, mas mal regado?

Com trabalho. Os meus alunos sabem que têm de trabalhar mais para encontrar emprego. Muitos que não encontram emprego, investem na sua formação, fazendo mestrados. São trabalhadores, competitivos, sem porem de lado a camaradagem. É uma boa geração esta.

José Gonçalves (texto)
(20-out-11)

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Eduardo Brum conversa com Cristóvão de Aguiar no Mundo Açoriano

Conversa
Os ilhéus são um
bocado bazofeiros
talvez por viverem
rodeados de mar
O escritor picopedrense conversa com Eduardo Brum sobre a sua obra, os Açores, Coimbra, a ilha do Pico, S. Miguel, o liceu de Ponta Delgada, as humilhações da infância e da adolescência...


A tua obra “Raiz Comovida” não gerou consenso quando foi inicialmente publicada…
Para além da surpresa de ter utilizado, como escrita literária, o léxico da Ilha, houve quem se entretivesse a discutir, teoricamente, se o livro caía no domínio do romance ou não. A chamada discussão sobre o sexo dos anjos… Havia dúvidas quanto à classificação clássica, que distingue entre romance, novela e conto. Gaspar Simões, o crítico mais semanal da imprensa portuguesa, escreveu que se tratava de um colar de pérolas ao qual faltava o fio! (Risos). Foi um grande elogio, sobretudo porque, além de vir de quem vinha, o crítico debruçava-se sobre outros dois escritores micaelenses, Dinis da Luz e Manuel Ferreira, e a apreciação sobre ambos não era muito favorável. A partir daí gerou-se a dúvida. E eu passei a fintar os críticos: romance ou o que lhe queiram chamar… novela em espiral… conto a que se acrescenta um ponto, etc.

Incomodavam-te as classificações?
As classificações não me incomodavam, porque já se não usam, foi chão que já deu muitas uvas. Já reparaste quão estúpido e difícil se torna distinguir entre conto e novela? Pelo número de páginas? Nunca soube nem curo de saber. No que me diz respeito, essa classificação ou destrinça que o crítico achava por bem fazer ocupava muito espaço antes de entrar no livro propriamente dito…

Quando olhas para trás, hoje, fazes um “balanço” da tua escrita?
Balanço em que sentido?

Que vês na tua escrita observando de longe?
Que vejo na minha escrita? Sou a pessoa menos indicada para discretear sobre este assunto. Normalmente, o escritor é o que sabe menos sobre a sua obra, por mais paradoxal que possa parecer... Mas, se insistes, vejo sobretudo narrativas e outras lérias sem classificação, além de uma poesia péssima, de que não me envergonho por ter sido, como qualquer outro dos meus livros, arrancada de mim… Só que o meu modo de expressão não era esse. Há quem diga que a minha prosa tem mais poesia que os versos. Falando há dias com o tradutor italiano de “Passageiro em Trânsito”, livro tão mal-amado e zurzido por uma luminária da crítica micaelense, dizia-me ele, modéstia à parte, que o livro parece-lhe que tem mais a ver com a poesia do que com a prosa…

És perfeccionista?
Não tenho pejo em afirmar que sou um grande perfeccionista ou narcisista, creio que tanto faz. Escrevo como quem pratica onanismo... Escrevo, emendo, corto, modifico, acrescento, até ficar com a cabeça num labirinto ou num “lavarinto”, como se diz na ilha… Então, quando manuscrevia, era o cabo dos trabalhos, porque não conseguia ver, no papel, emendas: tinha de reescrever tudo e, na reescrita, ia alterando, podando, uma verdadeira enxaqueca daquelas que se sofre durante o pós-guerra…

Corrigir é uma forma de bem escrever…
Pode não ser. Às vezes perde-se a frescura e o encanto das primeiras palavras que o escritor vai descobrindo… Só alguém alheio à criação poderá ver a diferença. O escritor, ao substituir, já está cansado daquelas palavras, podendo muito bem estar a substituí-las por outras com menos frescura… Miguel Torga, na ânsia de aperfeiçoar a sua escrita até ao osso, foi muitas vezes acusado disso. O meu mais recente livro, “Catarse”, foi terminado em Janeiro de 2011, mas em Março ainda estava a ser reescrito, o que não significa que seja uma obra-prima de escrita…

Que vês, então, olhando para trás?
Vejo-me viajante de uma narrativa interior, a viagem mais autêntica que o escritor pode empreender.

Mas há um discurso açoriano na tua escrita?
Com certeza. Um discurso micaelense, talvez seja mais correcto dizer. Açoriano é um adjectivo que não diz nada ou diz muito pouco, uma vez que temos nove realidades distintas no nosso Arquipélago. Não se fala açoriano! Fala-se micaelense, terceirense, etc.. Não se nasce numa ilha em vão. Há uma marca de origem. E é essa marca que vai entroncar na escrita portuguesa dos séculos XVI e XVII. Veja-se os termos “chamatão” e “pêloei”, discreto, no sentido de inteligente (provém do verbo discernir) entre muitíssimos outros, que já caíram em desuso na matriz, mas que ainda se utilizam nos locais mais afastados dos grandes centros, onde a língua se vai adulterando... Agora, com a rapidez dos meios de comunicação, houve uma espécie de nivelamento por baixo, o que leva muita gente a repetir as asneiras linguísticas que os locutores, os políticos e outros figurões vai debitando sem nenhum respeito pela língua, a nossa Pátria, como bem disse Fernando Pessoa.

A ilha de S. Miguel tem um discurso rico?…
O mais rico de todas as ilhas! Alentejano, transmontano… A nossa pronúncia é que nos trai. Comem-se as sílabas, e não raro não se entende. Mas o discurso escrito é rico no léxico e em certos achados linguísticos. Daí que a pronúncia não se pode nem deve confundir com o léxico, que é riquíssimo.

Há uma cultura açoriana bastante estendida no tempo que penetra muito na cultura portuguesa e que não é reconhecida como tal…
Açoriana, portuguesa… Não concordo com a distinção. Acho que a cultura portuguesa é que penetrou na nossa. É natural que tivesse havido muitas adaptações derivadas do meio, do clima, da actividade sísmica (veja-se o Espírito Santo, que se mantém vivo em todas as ilhas, enquanto na matriz de onde proveio há apenas resquícios), e foi essa actividade sísmica que fez perdurar, no tempo, o culto do Espírito Santo.

O estereótipo da cultura açoriana está muito associado a nomes como os de Antero de Quental, Vitorino Nemésio, Natália Correia…
Mas a cultura açoriana não se resume a esses nomes. Haverá, porventura, alguma coisa que lembre a Ilha na obra de Antero? Em Natália Correia, só muito no fim, porque, antes, quando ela deslumbrava toda a Lisboa do seu tempo, não queria, não gostava que lhe lembrassem a sua origem ilhoa. Respondia que tinha daqui saído muito novinha (cinco anos) e não se considerava filha cultural da Ilha onde nasceu… Mais tarde, era chique ser das ilhas, escrever livros ou poemas com fundo ilhéu, mesmo que fosse a martelo, isto é, de fora para dentro. A ilha não fazia parte do sangue. Nemésio, Roberto Mesquita, esses sim. Espelham o viver rodeado de mar por todos os lados… Aqui há uns anos, houve um concurso literário da Secretaria Regional da Cultura, a que podiam concorrer residentes, não residentes, mas cá nascidos, e todos os que falavam a Língua Portuguesa que nunca cá viveram (ridículo!). E mais ridículo ainda era o facto de para os residentes e os açorianos que viviam noutras partes o tema ser livre (jogos florais). Para os não naturais, o fundo das obras tinha de reflectir a ambiência das ilhas (magnífico!) Ganhou, nesse ano, uma escritora coimbrã, com um romance de setenta páginas, sendo o prémio de oitocentos mil escudos, mais de mil por página. Li o livro, tenho-o aqui à minha frente: uma “novelada” (intitula-se novelos), escrito a partir de folhetos turísticos para que houvesse cheirinho a hortênsia, a bosta de vaca, a “bedume” de polpa e a pasto… E o júri composto por altas pensâncias de Lisboa caiu na esparrela como canarinho…

A tua escrita veio “desenterrar” o discurso da cultura açoriana mais profunda…
Não desenterrei coisíssima nenhuma, não fiz investigação linguística e, se o fizesse, a naturalidade da escrita ia-se... Tratava-se de uma questão estética. Eu falava assim, ouvia falar do mesmo modo, e queria transformar o nosso léxico em linguagem literária… Se o consegui, ou não, não me compete dizer.

Se não desenterraste, acabaste por explorar, potenciar…
Como me interesso muito pela Língua Portuguesa, procurava saber por que é que se diz isto, por que é que se diz aquilo… e verifiquei que boa parte do que dizemos em S. Miguel é português arcaico.

A tua escrita tornou-se uma espécie de “ponte” entre vários tempos da cultura portuguesa…
“Raiz Comovida” era incompreensível para Gaspar Simões, mas em regiões como Bragança, Trás-os-Montes em geral, Beira Alta, há pessoas que o entendem e utilizam muitos desses termos incompreensíveis para os salões lisboetas, onde se pronuncia “insêto”, e outras estupidezes... Repara no termo “pitafe”, que se usa também no Alentejo (a nossa matriz linguística) e se aplica a qualquer coisa que tem defeito – esta sopa tem “pitafe”… Provém do termo “epitáfio”. Os açorianos levaram a Língua Portuguesa para o Brasil (a primeira leva de emigrantes que saiu das nossas ilhas para o Brasil data de 1677). No Brasil, fala-se um Português por vezes muito mais correcto do que o que lhe deu origem, sobretudo nos particípios passados dos verbos e na abertura das vogais. Camões recitado por um declamador brasileiro é mais musical, até a métrica fica mais marcada… Não admira. Ficou ilhado, sem receber influências, tal como as nossas ilhas, Trás-os-Montes, Alentejo… Se, por exemplo, quisermos ouvir falar como se falava há cinquenta anos no Pico da Pedra e em Rabo de Peixe só temos de nos deslocar a Fall River, nos EUA. As pessoas não se integraram na cultura norte-americana, formaram um grupo à parte, e congelaram a língua que da ilha trouxeram. Agora o cenário está a mudar por causa da RTP Internacional. Todavia, não advogo que todos falem da mesma maneira. O que dá profundidade cultural a um país é a diversidade.

Há todo um peso cultural que transita para a tua escrita…
Nunca tive pejo de assumir a minha origem de ilhéu micaelense, ao contrário de alguns outros escritores que, só depois da “fundação” da chamada literatura açoriana, principiaram a ter orgulho na sua origem, porque só assim poderiam ficar no retrato de uma novel literatura.

De certa maneira, pareces ser a literatura em forma de pessoa… Ou se a literatura tivesse uma forma humana poderia ser a tua forma…
Não exageremos. Sou um escritor, mais nada. Há um mecanismo de criação que desconhecemos ou que desconheço. Quando estou a escrever, vêm-me à cabeça coisas que em estado de vigília não surgiriam.

É o discurso do inconsciente… discurso do irracional.
É preciso que haja um pretexto para que o inconsciente se manifeste ou exploda.

Qual o teu pretexto?
A guerra, a infância, a adolescência, a ilha, a freguesia onde fui parido, as pessoas que me marcaram, negativa e positivamente, o liceu que, durante nove anos, me marcou e me deixou algumas alegrias e muitas tristezas e amarguras…

O liceu daquele tempo foi uma humilhação?
No liceu, tive duas fases: a da humilhação e a da glória, embora esta última fosse falsa. Se não tivesse ido estudar para Coimbra e tivesse acreditado no que me diziam alguns dos meus mestres de Português, teria ficado convencido de que era um sábio. Ficar na ilha é por vezes uma maneira de julgarmos que somos os maiores do planeta e arredores… Na minha freguesia, fui mesmo humilhado em certas fases da minha vida. Por exemplo, quando chumbei dois anos seguidos no antigo terceiro ano do Liceu. Tuteavam-me quando passava no caminho, mas, quando me tornei bom aluno, nunca ninguém teve o alvedrio de me dar uma palavra de estímulo… Santa freguesia!

E Coimbra?
Em Coimbra, aprendi muito dentro e mais ainda fora da Universidade… Aprendi também a humildade, que era uma atitude que não tinha. Não admira. Era ilhéu, e os ilhéus, como se sabe, sabem tudo... Quando lá cheguei, na companhia de Viriato Madeira, dissemos um ao outro: “Mas nós não sabemos nada! Esta gente fala de outra maneira”. E não era uma questão de sotaque. Vi jovens que avançavam para uma Assembleia Magna e que abordavam os assuntos de forma desassombrada e assombrosa, num discurso que se podia escrever… Manuel Alegre era um deles! O choque foi tal que, a certa altura, quis mesmo vir embora e escrevi uma carta à família com esse intuito. Se fosse hoje, tinham-me respondido: “Vem, querido filho, que aqui estás no teu cantinho, sossegado, fora dessas babilónias de pecado…”

É como se viver na ilha limitasse a capacidade de reflexão ou de expressão?
Não é só isso. É que todos os ilhéus são um bocado bazofeiros, talvez por viverem rodeados de mar. Julgam que o centro do mundo se instalou ou passa pelo seu umbigo... Resolvem tudo… sabem tudo. Até há quem diga: “Se eu fosse primeiro-ministro, punha este país de pé num zape…”, ao que apetece responder: “Muito bem falas, Manel, mas como irás pôr o país em pé, se nem sabes governar a tua casa?”

Há muita falta de humildade…
Com certeza. E o medo de ser frontal. Quem porventura o é pode sofrer alguns amargos de boca… Ser crítico é ser má-língua, ter um feitio insuportável, intransigente, casmurro, explosivo, e tudo de mau que existe debaixo da rota do Sol… Tal como eu, como dizem Onésimo, Daniel de Sá, e outros ilustres intelectuais da nossa praça, o Campo de São Francisco… Custa-me a entender que alguns intelectuais vão ao ponto de criticar quem tem coragem de assumir certas posições diferentes do politicamente correcto. Só conseguem falar por trás, é mais seguro, dá milhões, é-se bem-visto pelas autoridades culturais, dá viagens e outras benesses…

Não será que as pessoas estão “formatadas” para funcionarem segundo determinadas regras, já que nos meios pequenos a noção do outro é muito mais forte do que nos meios maiores? Nas ilhas, há uma noção de vizinhança muito acentuada. Vai-se ao café e o empregado diz-nos: “Que vai ser, vizinho?...”
A vizindade sempre foi muito importante. Ser vizinho é, por vezes, pertencer à mesma família, mas se há malquerenças, é o diabo entre as couves. Já diz o povo: “Antes ter um mau ano que um mau vizinho”.

A proximidade do outro tem muita influência no dia-a-dia…
É verdade. Mas, por vezes, caímos nos estereótipos. Por vezes perguntam-nos: “Como está, como tem passado? Muito bem, obrigado”. Mas se a pergunta for – “estás bem?” – e a resposta – “ão, estou muito mal”, a reacção que obtenho é: “Isso não é nada, isso passa…”, e a pessoa que indagou dá meia volta e vai-se embora. Bebe uns copos, vais ver que ficas rijo! A resposta esperada, sacramental, seria: “Estou muito bem, obrigado!” Ora, isto não é nada, isto não é convivência.

Tu não és assim?
Não sou e por isso apanho cada dissabor…

Essa tua fuga à regra cola-te a uma imagem de conflito e de polémica…
E dizem que perco mais do que ganho com estas coisas. Ganhar o quê? O apreço de medíocres? Tenho escrito em jornais sobre assuntos com os quais discordo. Na ilha do Pico houve pessoas que deixaram de falar comigo por essa razão, algumas delas por medo. É que naquela ilha ainda se fala da justiça da noite…

Como surge o Pico na tua vida?
Eu conhecia o Pico muito mal (fui lá pela primeira vez, durante uma simples manhã, na viagem de finalistas do 7º ano do liceu). Em 1996, juntei, em Coimbra, um grupo de 29 pessoas e combinámos ir ao Pico por 15 dias: sete dias no Pico, dois na Terceira e os restantes em São Miguel. Principiámos pelo grupo central porque tinha a minha fisgada: quando chegássemos a São Miguel seria a apoteose! Quando lá chegámos, fomos percorrer a Ilha e ver os locais mais consabidos… Todos gostavam muito, mas logo a seguir comentavam: “É muito bonito… mas o Pico…”. Um dizia-o, o outro repetia-o e eu próprio dei por mim também a dizer: “É muito belo, mas o Pico…”. Há qualquer coisa naquela ilha que nos atrai…

É verdade.
Até pode ser magnético. Numa noite limpa, as estrelas brilham mais sobre o pico do Pico. Decidi fazer lá uma casa. Ali, eu sentia o arquipélago. É que a ilha em frente, segundo Raul Brandão, é muito importante. Dá-nos a sensação de que há mais mundo, de que não estamos desacompanhados…

É uma sensação completamente diferente de viver em S. Miguel…
É verdade. Para mim, a ilha em frente era a Serra de Água de Pau… Santa Maria só muito raramente se mostrava como uma sombra no horizonte, e quando assim acontecia, tínhamos chuva pela certa. Mas tive sorte. Quando entrei para o liceu, em 1951, as camionetas da Ribeira Grande eram bastante irregulares e avariavam em quase todas as viagens. E então ficou decidido que eu ficaria alojado numa pensão, em Ponta Delgada. Nessa pensão, tive o privilégio de encontrar jovens estudantes de todas as ilhas, mais velhos do que eu, e passei a dar-me conta da geografia, pronúncias e maneiras de pensar diferentes. Só conhecias as ilhas pelo mapa…

Não te esqueças de que estávamos a falar da tua decisão de fazer uma casa no Pico…
Ah, pois. Arranjei um terreno, em S. Miguel Arcanjo, de onde se via a ilha de S. Jorge de ponta a ponta! Era um pasto. Perguntei ao vizinho se a propriedade estava para venda. “Não sei”, respondeu ele. “Isso é de um senhor que está no Canadá. Mas, se quiser saber, pode falar com a cunhada, que mora aqui mais acima. É procuradora e contacta com ele todas as semanas”. E assim fiz. Dias depois, soube que o proprietário estava na disposição de vender o terreno. Aceitei o preço, não regateei, e fechei negócio. Disseram-me que era muito caro, mas eu não quis saber. Comecei logo a fazer a casa. À moda antiga do Pico, de acordo com as leis anti-sísmicas

Miguel Torga é importante na tua vida…
É, com certeza. Tem uma escrita telúrica, na qual arranca às pedras de Trás-os-Montes aquela concisão, aquela secura… aquele não desperdício de palavras.

Em tempos, li bastante da sua obra, mas hoje não o voltaria a fazer…
Uma pessoa também não pode estar sempre agarrada ao mesmo escritor… O que é preciso é saber se a nova geração o lê ou não.

Eu deixei de ler o Torga, mas não deixei de ler o Eça…
Torga reflecte na sua escrita um Portugal que, em parte, já não há, mas a mentalidade do povo continua: os seus vícios, defeitos, manhas, esperteza saloia, comuns a todos os povos. Por isso, a sua obra continua válida (pelo menos para mim) e universal.

Torga não deu o salto para a contemporaneidade…
Não sei muito bem o que é a modernidade. Badala-se tanto sobre ela, que acabo confundido. Será a modernidade sinónimo de tecnologia avançada, comunicações instantâneas? E o homem, como se encontra nos seus instintos? Teria evoluído a par de toda essa parafernália tecnológica? Ou terá ficado, no íntimo, igual ao seu antepassado das cavernas? Mata-se hoje em dia com a mesma crueldade com que se fazia há milhares de anos. Talvez haja mais requinte derivado da modernidade e das suas consequências. É evidente que a escrita e a arte em geral devem acompanhar esse desenvolvimento. Mas, se reflectem o Homem na sua humanidade, os temas são sempre os mesmos: a morte, o amor, o ódio, e tudo o resto que o ser humano carrega dentro de si desde que apareceu à face da Terra…

Hoje, prefiro ler um livro teu do que um livro do Torga. Tens uma capacidade de abertura que ele não tem.
Não sei aonde pôr as palavras com essa tua afirmação! Torga é Torga e eu, à sua ilharga, sou um pigmeu. Convivi com o Torga durante um ano e tal. Todos os dias ia buscá-lo ao consultório para irmos dar uma volta por Coimbra ou arredores. “Ó Cristóvão, podemos ir ali a cima?” Eu percebia o que ele queria. “Vamos ali àquele miradouro…”. Lá íamos. Tinha com certeza um poema a pedir para nascer… Vivia única e exclusivamente para a literatura. Transformava tudo em literatura. Disse à mulher em vésperas do casamento: “Vou procurar ser um bom marido, mas digo-te com toda a franqueza – em qualquer circunstância, troco-te por um verso!” Disse-o e escreveu-o. Esta era a sua têmpera. Quis ser escritor por vontade e fazia da escrita um sacerdócio laico. Um dia, contei-lhe certos passos da minha vida. Ouviu-me com muita atenção. Quando terminei, disse-me: “Por que não escreve tudo o que me contou? Talvez desse uma espécie de “Criação do Mundo…” Salvo as devidas proporções, digo agora eu.

Durante vários anos, Torga chegou a ser candidato ao Nobel…
Estou muito contente por termos um Nobel da Literatura português, mas penso, sinceramente, que o prémio tinha ficado muito mais bem entregue a Miguel Torga do que a Saramago. A sua escrita tem muito lugar-comum…

Saramago é um lugar-comum…
Pois…

Terminemos, voltando à terra onde nasceste: que representam os Açores, hoje, para ti?
Os Açores, para mim, hoje… são uma memória afectiva. Sou um misto de Açores e de Coimbra, embora eu não queira nem consiga distinguir entre ambos. Quando uma pessoa sai da sua terra desenraíza-se…

Deixa de ter pátria…
Passa a ter raízes aéreas. Perde o chão. E nunca está bem em parte nenhuma. Agora, estou mais calmo, mas no tempo de estudante, quando estava de férias em São Miguel, cheguei a voltar mais cedo para Coimbra. Todavia, uma vez lá chegado, arrependia-me! Havia uma dualidade, um conflito interior. Mas houve uma coisa interessante que aconteceu comigo: vim a São Miguel em 1994 e não fui ao Pico da Pedra. Nessa altura, senti-me muito melhor na ilha.

O Pico da Pedra era uma opressão…
Exactamente. A causa do meu mal-estar era o Pico da Pedra da minha infância e da minha adolescência. Comparando com a actualidade, eu diria que o Pico da Pedra tinha os seus talibãs! Ir estudar para Coimbra foi a oportunidade que tive para me desligar de tudo isso.
Cristóvão de Aguiar
Escritor
Natural de S. Miguel, residente em Coimbra e Pico

Mundo Açoriano

























segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Crítica literária do livro Miguel Torga o Lavrador das Letras, in Campeão das Províncias.

É um livrinho pequeno mas rico em testemunho. Em “Miguel Torga. O Lavrador das Letras. Um Percurso Partilhado” Com Chancela da Almedina, o escritor açoriano Cristóvão de Aguiar reúne excertos das suas publicações diarísticas—“Relação de Bordo” I e II, e a “Tabuada do Tempo—A Lenta narrativa dos dias”_, nos quais existem referências a Miguel Torga, fruto da convivência e do intercâmbio que ambos tiveram mais de um ano.

“ Os laços afectivos e literários que me enleiam à obra do poeta e escritor Miguel Torga Datam de há mais de 40 anos”, refere recordando as primeiras impressões da obra do médico, fruto de leituras ainda na ilha de São Miguel, enquanto jovem.”

Na altura leitor assíduo de Eça de Queiroz, Cristóvão de Aguiar confessa que, “pelo pouco que havia lido, notara logo que o estilo de Miguel Torga era totalmente distinto do cinzelado nas obras do pobre homem da Póvoa de Varzim—mais enxuto, descarnado e de uma seriedade granítica. Ali não se vislumbrava um pingo de ironia.”

Foi já em Coimbra, onde se instalou na década de 60, que Cristóvão de Aguiar conheceu verdadeiramente a obra do escritor transmontano. “Só em Coimbra, após a guerra colonial, e já numa idade mais amadurecida, me encafuei de tal forma na obra torguiana, que ainda hoje, passados todos estes anos, continuo a frequentá-la com uma assiduidade de devoto que ainda não esfriou a sua fé”, admite.

“ Esta paixão deve ter tido origem não só na prosa apurada com que o escritor lavra a página de cada livro e me fascina pela simplicidade trabalhada até à placenta da palavra mas também no facto de a ambiência espelhada nos “Contos” e sobretudo em  “A Criação do Mundo” ser idêntica, ou muito semelhante, ao pequeno grande mundo da Ilha onde fui nado e criado”, justifica.

Aida hoje, confessa ainda o escritor, ” a (re)leitura dos livros de Miguel Torga invade-me de uma paz rústica, genuíno oásis neste mundo barulhento e transmuda-se num conchego caldeado de uma ansiedade mansa”. Torga, acrescenta, “é uma personalidade rebelde e inquieta e refelecte-a como poucos em toda a sua vasta obra.
1.º Centenário do seu nascimento.

sábado, 8 de outubro de 2011

Monumento ao Bombeiro, Brasfemes, Coimbra.



A escultura ontem inaugurada foi oferecida há cerca de quatro anos, aos bombeiros voluntários de Brasfemes, na pessoa do comandante adjunto Sr. Rui Gonçalves, pelo Advogado José Manuel Dias de Aguiar, pelo proprietário do restaurante cinco estrelas Joaquim Pereira e pelo bate chapas José dos Santos.
No dia 2 de Outubro de 2011, transformou-se no único monumento ao Bombeiro existente em Coimbra.

Cyrano de Bergerac

Cyrano de Bergerac
Eugénio Macedo - 1995

TANTO MAR

A Cristóvão de Aguiar, junto
do qual este poema começou a nascer.

Atlântico até onde chega o olhar.
E o resto é lava
e flores.
Não há palavra
com tanto mar
como a palavra Açores.

Manuel Alegre
Pico 27.07.2006