Coimbra, 29 de Abril de 1974 ¾ Este ainda arremedo de democracia em que começámos
a balbuciar os primeiros vagidos dá por vezes a ideia de se ter transformado
numa navalha de dois gumes. Principia a cultivar-se o berro pelo berro, pelo
que, por vezes, o berreiro torna-se ensurdecedor. É que os cravos de Abril só
medrarão nos canteiros de Maio se estes estiverem de antemão mondados de
certas ervas daninhas. Não é bonito que a democracia sirva de pretexto para
consolidar os seus próprios inimigos, à pala de que, num regime dessa natureza,
há liberdade para todos, até a que basta para que ainda possa servir de trampolim
para muitos daqueles, que neste último meio século português, fizeram dela
letra morta e que agora, para se tornarem visíveis, procuram a qualquer preço
apregoar aos quatro ventos as suas virtudes democráticas.
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