Escalada do petróleo ameaça Orçamento
Margarida Peixoto e Luís Reis Pires
25/02/11 00:05
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Se o preço médio dos primeiros dois meses se mantivesse no resto do ano, a factura energética do país subia 1.650 milhões de euros.
Quase 100 euros por barril: esta é a média do preço do petróleo deste o início do ano até ontem. A escalada dos preços, impulsionada pela violência no Mundo Árabe, já deitou por terra o custo médio assumido pelo Governo no Orçamento do Estado para 2011. Esta será mais uma das várias dificuldades para o cumprimento do défice orçamental.
No OE/2011 a equipa de Teixeira dos Santos assumiu um preço médio de 78,8 dólares por barril para este ano. Mas em menos de dois meses a média do preço do ouro negro atingiu já os 99,9 dólares - mais 21 do que o esperado. Ontem o barril de brent chegou a ser negociado em Londres perto dos 120 dólares.[CORTE_EDIMPRESSA]
Um risco para o Orçamento, garante Luís Aguiar-Conraria, professor na Universidade do Minho. "Mesmo sem a alta de preços, este OE já era uma ficção porque prevê uma evolução positiva do PIB quando todos esperavam uma queda. Agora será mais negativo ainda", defende o economista.
O impacto no Orçamento será indirecto. "Numa primeira fase a subida dos preços de petróleo e a sua transmissão à economia poderá ter um efeito positivo, pelo aumento das receitas de impostos", diz Paula Carvalho, economista do departamento de research do BPI. "Mas sendo um efeito prolongado tem um impacto negativo, porque provocará a retracção global do consumo", acrescenta.
O aumento do preço do petróleo reflecte-se com alguma rapidez nos preços da energia e este, por sua vez, afecta o resto dos bens. Tendo em conta que os orçamentos familiares não esticam, "os consumidores têm de alterar a composição do seu cabaz de compras e reduzir consumos", concretiza Paula Carvalho.
E menos consumo implica menor actividade económica e um produto interno bruto mais baixo. Aguiar-Conraria garante que a duplicação do preço do petróleo tem um impacto negativo de 1,5 pontos percentuais na riqueza do país. "Não vai duplicar, admito, mas vai aumentar cerca de 50%. Por isso, espero pelo menos um efeito negativo de 0,5 pontos no PIB", explica o professor. O mesmo é dizer que mesmo que o Governo acertasse na previsão de crescimento de 0,2% para este ano, teremos uma recessão de 0,3%, só pela alta do petróleo.
Uma evolução desfavorável da economia tem impacto no Orçamento do lado da receita, mas não só: também coloca em causa a previsão de despesas, devido ao aumento dos gastos com apoios sociais. "As empresas são forçadas a reduzir custos, o que tem impacto no emprego", esclarece Paula Carvalho.
Perante os números, e apesar dos riscos que a manutenção dos preços altos implica para os objectivos traçados para as contas públicas, o Governo rejeitou ontem qualquer revisão das estimativas inscritas no OE. "Continuamos a acompanhar a situação e não vamos naturalmente fazer alterações de projecções orçamentais em cima do acontecimento", frisou Pedro Silva Pereira, ministro da Presidência.
Factura energética sobe 1.650 milhões de euros
No ano passado Portugal gastou 8.023 milhões de euros em importações de combustíveis e lubrificantes. Teixeira dos Santos assumiu que o preço médio do petróleo seria 3,4% mais alto em 2011, mas, os números desde o início do ano até agora apontam já para uma valorização de 24,3%.
A esta variação há que descontar, no entanto, o efeito do câmbio. Como o euro tem valorizado e está acima do dólar, a subida de preços é atenuada para 22,1%. Se não fosse o euro, Portugal arriscar-se-ia a pagar quase dois mil milhões de euros a mais pelo mesmo volume de importações. Mas o escudo do euro vale cerca de 350 milhões de euros: ao preço médio actual a factura fica mais cara em ‘apenas' 1.647 milhões de euros.
As mesmas contas ao aumento dos custos estão já a ser feitas pelas empresas. "Por cada 10 dólares que sobe o preço do barril, a factura em Portugal sobe 800 milhões de euros", alertou António Mexia, presidente executivo da EDP, à margem da inauguração de um laboratório FABLAD (o primeiro de prototipagem aberto ao público).
Tendo em conta que a economia portuguesa tem ainda muita intensidade energética - o que quer dizer que as empresas consomem muita energia - a subida dos preços tem um impacto significativo na balança de transacções correntes. A consequência é a subida do défice externo - um dos indicadores para onde apontam os holofotes dos mercados e instituições internacionais. Mesmo sem a subida dos preços, Portugal já era um dos que saía pior na fotografia: o défice externo está projectado para 8,8% do PIB este ano, o maior da OCDE.
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