Fonte: Diário Económico
Há um ano a economia também estava em crise, mas tirando isso, tudo o resto é diferente. As famílias pagam mais impostos, têm menos apoios e os preços começam a subir.
"Entretanto, o mundo mudou", disse José Sócrates, há cerca de dois meses. Que o digam as famílias: em apenas um ano, os impostos subiram, há quase 100 mil novos desempregados e o rendimento disponível entrou em queda. Passados um ano e 12 dias desde o último debate do Estado da Nação, a crise mantém-se, mas a economia nem parece a mesma.
"A alteração mais importante foi termos passado de uma política expansionista para uma contraccionista, tanto a nível europeu, como em Portugal", diz Pedro Laíns, economista e investigador na Universidade de Lisboa. Os termos técnicos escondem uma realidade bem palpável para as famílias e para as empresas: em vez da aposta no crescimento e no emprego - com a introdução de apoios e subsídios -, a prioridade passou a ser a correcção do défice orçamental.
Ao contrário do que se esperava em Julho do ano passado, o défice orçamental não ficou nem perto da previsão de 5,9%. As contas finais revelaram um desequilíbrio de 9,3% do PIB e uma dívida pública crescente, que levou os mercados a desconfiar da capacidade de resposta do Estado português no momento de pagar as dívidas. "As ameaças são diferentes. Em 2009, havia o medo de se cair numa brutal recessão; agora há a ameaça de os Estados entrarem em incumprimento", nota Luís Aguiar-Conraria, economista e professor na Universidade do Minho.
O resultado foi a passagem abrupta da política de apoio à economia - com investimentos públicos na renovação do parque escolar, por exemplo, ou com a promessa de um TGV que ligue Portugal à Europa - para uma estratégia de aumento de impostos e corte a direito nas despesas.
"A segunda grande alteração foi na política de obras públicas", acrescenta Laíns, referindo-se ao congelamento das linhas de alta-velocidade Lisboa-Porto e Porto-Vigo, mais uma inevitabilidade ditada pela obrigação de poupar.
Mas não é só o Estado que será obrigado a fechar os cordões à bolsa. As famílias e as empresas também não terão outra alternativa. Os impostos, tanto sobre os rendimentos do trabalho, como nos lucros das empresas estão mais altos; os juros já começaram a subir, inflacionando as prestações dos empréstimos à habitação; e os preços dão sinais de aumento, com a subida do IVA e a valorização do petróleo.
Perante este aperto, os salários mantiveram-se, na grande maioria dos casos, inalterados. A Função Pública teve aumento zero e muitas empresas seguiram o exemplo do Estado. Feitas as contas, o rendimento disponível já está em queda e o Banco de Portugal antecipa que o corte no dinheiro que os consumidores têm disponível todos os meses seja de 1,3% este ano.
A juntar a estas dificuldades, o medo do desemprego mantém-se, com a agravante de os apoios sociais serem agora mais restritos. "Muitas medidas de combate à crise foram revertidas. Mas o que é mais grave é que, neste momento, o desemprego não é uma escolha pessoal e por isso estamos a negar apoio a quem mais precisa", critica Luís Aguiar-Conraria.
As expectativas para 2011 não são melhores. É que se é certo que a economia saiu do vermelho no primeiro trimestre deste ano, com um crescimento de 1,8% face ao período homólogo, nada garante que o crescimento se vai manter na segunda metade do ano e durante 2011.
A razão é simples: a economia funciona como uma espécie de bola de neve. Se as famílias têm os rendimentos reduzidos e estão ameaçadas pelo desemprego, diminuem os níveis de consumo - a previsão é que em 2011 haja uma retracção de 0,9% do consumo privado, o pior valor desde o 25 de Abril, diz o Banco de Portugal. E se não consomem, as empresas não vendem, tornando muito difícil colocar a economia a crescer. Um argumento a favor poderia ser o bom comportamento das exportações na primeira metade do ano (cresceram 9,8%), mas também os principais parceiros comerciais portugueses estão a colocar no terreno medidas de austeridade, pelo que tudo indica que também aqui tenha sido sol de pouca dura.
10/07/15 11:14
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