Coimbra, 13 de Janeiro de 1973.
"Às 14h40m levantou voo o avião que levou o meu filho Zé para a América. Para ele, viajar para o outro lado do mar ou para casa do vizinho, não existe qualquer diferença. Quando, às 13h10m, os altifalantes chamaram os passageiros para bordo, senti qualquer coisa a despedaçar-se dentro de mim e não consegui reter as lágrimas. Ele, impávido, correu de mão dada com o tio Francisco para a porta de embarque e acenava com a outra mãozita, firme, como que aconselhando-me calma e coragem. Durante a viagem de Coimbra para Lisboa, falou pouco, mas, de vez em quando, saía-se com uma das suas. De uma vez disparou, a experimentar como iam os ânimos: Se não quiser ir, o que é que acontece?. Tomava pulso à possível reacção dos pais e salvaguardava a sua hipotética desistência à hora da partida. Esperei que o avião descolasse. Uma hora mais tarde, fez-se à pista e, pouco depois, ergueu-se no ar. Já no alto, sempre a subir, tive a impressão de que uma parte de mim se havia desprendido do meu corpo e corria, louca, pelo céu fora, em cata de qualquer coisa de mais puro, mais livre, menos cinzento do que este bloco de nuvens que se vem aproximando com cara chapada de chuva e de tristeza."
Cristóvão de Aguiar, in Relação de Bordo 1964-1988.
"Às 14h40m levantou voo o avião que levou o meu filho Zé para a América. Para ele, viajar para o outro lado do mar ou para casa do vizinho, não existe qualquer diferença. Quando, às 13h10m, os altifalantes chamaram os passageiros para bordo, senti qualquer coisa a despedaçar-se dentro de mim e não consegui reter as lágrimas. Ele, impávido, correu de mão dada com o tio Francisco para a porta de embarque e acenava com a outra mãozita, firme, como que aconselhando-me calma e coragem. Durante a viagem de Coimbra para Lisboa, falou pouco, mas, de vez em quando, saía-se com uma das suas. De uma vez disparou, a experimentar como iam os ânimos: Se não quiser ir, o que é que acontece?. Tomava pulso à possível reacção dos pais e salvaguardava a sua hipotética desistência à hora da partida. Esperei que o avião descolasse. Uma hora mais tarde, fez-se à pista e, pouco depois, ergueu-se no ar. Já no alto, sempre a subir, tive a impressão de que uma parte de mim se havia desprendido do meu corpo e corria, louca, pelo céu fora, em cata de qualquer coisa de mais puro, mais livre, menos cinzento do que este bloco de nuvens que se vem aproximando com cara chapada de chuva e de tristeza."
Cristóvão de Aguiar, in Relação de Bordo 1964-1988.
5 comentários:
É muito à frente, lapa.
Deves ter umas boas estórias para contar, lapa.
Sem dúvida!
Belo texto.
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